terça-feira, 24 de março de 2009

A Sensação e A Percepção


I. NOÇÃO DE SENSAÇÃO.


1. Definição de sensação. — A sensação pode ser definida como um fenômeno psicológico produzido pela ação de um objeto sobre um órgão sensorial. A sensação é o resultado da transformação no cérebro de uma impressão originada de uma excitação provocada pelos objetos do mundo exterior. A sensação, no estado puro, nos permite apreender qualidades, sensíveis e não coisas propriamente dita. E, como raramente se encontra isolada, a sensação, quase sempre, representa antes o “resultado de uma abstração mental do que o fruto espontâneo de uma experiência psíquica". Deve, por isso, ser considerada como elemento da percepção e como manifestação intuitiva mais simples da consciência.


2. Condições orgânicas e psíquicas. — Para que se realize o fenômeno da sensação são necessárias três condições fundamentais:

a) Excitação — ação de um excitante ou agente provocador sobre o órgão sensorial. Os excitantes podem ser: mecânicos (choques, picadas, etc.), físicos (luz, som, calor, eletricidade) ou químicos (substâncias cáusticas, irritantes, etc).

b) Impressão — modificações orgânicas que se processam nos órgãos sensoriais e que se transmitem por fibras nervosas aos centros cerebrais.

c) Sensação — estado de consciência resultante dos processos anteriores.A primeira condição é de natureza físico-química. Só podemos explicá-la pela física e pela química. A segunda é de natureza fisiológica. Sua explicação é privativa da biologia. Somente a terceira condição é de natureza psicológica.


3. Elementos da sensação. — Toda sensação é integrada pelos seguintes elementos:

a) Um conhecimento — apreensão de uma qualidade sensível (som agudo, cor azul, sabor ácido, etc.);

b) Um estado afetivo — tonalidade agradável ou desagradável ligada a essa apreensão;

c) Uma atividade — movimentos realizados pelos órgãos sensoriais.


4. Classificação das sensações. — A divisão clássica em cinco sentidos corresponde a noções incompletas sobre a natureza e a função dos órgãos sensoriais. Segundo Cuvillier, essa divisão é insuficiente, não só do ponto de vista anatômico como do ponto de vista psicológico. Do ponto de vista anatômico, está estabelecido que o tato pode ser decomposto em 4 ou 5 sentidos elementares, tendo, cada um, seus órgãos receptores distintos. Do mesmo modo, o ouvido compreende dois órgãos sensoriais: o da audição e o do equilíbrio. Do ponto de vista psicológico, para a consciência, uma sensação de frio difere tanto de uma sensação de contato, quanto uma sensação visual difere de uma sensação auditiva. Na realidade, podemos distinguir dez espécies de sentidos que deverão ser classificados da seguinte maneira: Sensações internas, correspondendo às impressões provenientes do interior do organismo; são as sensações sinestésicas;

a) Sensações motoras, correspondendo às impressões provenientes da atividade do próprio organismo; são as sensações: 1) estáticas ou de equilíbrio; 2) quinésicas ou de movimento;

b) Sensações externas, correspondendo aos receptores que captam as excitações vindas do exterior e dos quais, uns, são impressionáveis por excitantes agindo por contato ou proximidade imediata: 1) sensações táteis; 2) sensações térmicas ou de calor e de frio; 3) sensações álgicas ou de dor; 1) sensações gustativas ou de paladar; e, outros, são impressionáveis por excitantes agindo à distância: 1) sensações olfativas; 2) sensações auditivas; 3) sensações visuais ou óticas.


A cada um desses sentidos corresponde um órgão especial: para as sensações visuais, os olhos; para as sensações auditivas, os ouvidos; para as sensações olfativas, a mucosa nasal; para as sensações gustativas, a língua; para as sensações táteis, térmicas e álgicas, terminações nervosas especiais; para as sensações estáticas ou de equilíbrio, os canais semi-circulares do ouvido interno; para as sensações sinestésicas ou de movimento,os nervos sensitivos dos músculos, das articulações dos membros e das cápsulas membranosas que os revestem. As sensações quinésicas ou de movimento nos informam sobre a posição dos membros e os movimentos que com eles executamos.


5. Caracteres da sensação. —

a) Toda sensação transmite um ensinamento do mundo exterior. Estes ensinamentos constituem um fundo original, donde resultam, após uma elaboração todos os nossos conhecimentos.

b) A sensação é distinta da propriedade do objeto que a provoca. Segundo Taine, esta distinção "se faz comodamente, pois a propriedade pertence ao objeto e não a nós, ao passo que a sensação pertence a nós e não ao objeto".

c) A sensação é distinta do processo fisiológico que a condiciona. Todo fenômeno fisiológico se reduz, em última análise, a uma modificação física ou química, enquanto que a sensação, como fato da consciência, é um processo puramente psicológico.

d) A sensação é essencialmente qualitativa. A sensação,sendo um fato da consciência, é um fenômeno qualitativo, susceptível de maior ou menor intensidade, mas que só pode ser observado, diretamente, por aquele no qual se realiza, não podendo, portanto, ser objeto de mensurações quantitativas.

e) Para que haja sensação é necessário que a excitaçãopossua uma intensidade mínima. A esta intensidade mínimada excitação capaz de produzir a sensação dá-se o nome de "limiar da intensidade da sensação".

f) A sensação, uma vez produzida, não desaparece logo, persistindo ainda durante algum tempo. Por essa razão, excitações seguidas, sucedendo-se com pequenos intervalos, são sentidas ou percebidas como uma única excitação. É o que acontece com as imagens cinematográficas.


6. Sensação e percepção. — As excitações que impressionam os nossos sentidos podem provocar em nós fenômenos diversos: ou são vagamente sentidas como impressões mais ou menos intensas e mais ou menos agradáveis; ou são, ao mesmo tempo, reconhecidas e interpretadas como sinais de objetos exteriores. À sensação interpretada, desta maneira, chamamos de percepção. A sensação, no primeiro caso, nos dá apenas a noção de uma qualidade ou de um estado (cor verde ou amarela, perfume suave ou intenso, som fraco ou forte), ao passo que, no segundo caso, como percepção, sugere a noção de um objeto determinado (cor de uma laranja, perfume de uma rosa, som de um violino).A percepção implica a "crença" na realidade exterior e um sentimento de "objetividade". Acompanha-se ainda de um verdadeiro "juízo de exterioridade". Essas reações mentais não resultam, somente, da visão do objeto. Nelas toma parte o cabedal de nossas experiências passadas. A percepção é um fenômeno complexo em que se reúnem, numa síntese, várias operações psicológicas: sensações, memória, associação, comparação, juízo, etc.


II. NATUREZA DA PERCEPÇÃO


7. Estrutura da percepção. — O mecanismo da percepção é objeto de divergência entre os psicólogos. Segundo a psicologia associacionista, a percepção é um conjunto de sensações que a associação une num todo homogêneo e ao qual a atenção confere clareza e nitidez. A sensação, a associação e a atenção representam, de acordo com esse ponto de vista, os elementos fundamentais do processo perceptivo. A Psicologia da Forma ("Gestalt-Psychologie") defende uma concepção diversa. Enquanto a psicologia associacionista considera a percepção como uma simples combinação de sensações elementares, a Psicologia da Forma concebe a percepção como uma síntese, como uma estrutura, como uma forma ("Gestalt"), constituída de elementos sem significação isolada, cujo valor não depende de atributos próprios, mas tão somente de sua posição no conjunto.


8. Caracteres da percepção. — Segundo a Psicologia da Forma, a percepção possui os seguintes caracteres fundamentais:

a) A estrutura da percepção possui uma organização própria. Ela unifica as partes e lhes dá uma significação. Há, assim, uma solidariedade íntima entre as funções exercidas por es elementos.

b) A estrutura da percepção possui um relevo próprio. Nela se revela um fundo sobre o qual se destaca uma figura. A qualquer instante, o fundo pode converter-se em figura.

c) A estrutura da percepção possui uma tendência a encerrar-se em si mesma. Manifesta-se como tendência a absorver os elementos novos que sejam assimiláveis e a repelir os que se mostrem demasiadamente estranhos. Por isso, a parte incorporada a um conjunto perde, quase sempre, a sua individualidade.


9. Erros da percepção. —

a) Ilusões — o hábito de perceber as sensações sempre sob certas condições faz com que, todas as vezes que uma delas aparece fora de suas relações normais, a interpretemos erroneamente. Estes erros de percepção constituem as ilusões. As ilusões podem se originar de todos os sentidos, mas não provêm de sensações falsas ou erradas, mas sim de juízos falsos, de interpretações errôneas de sensações.

As causas das ilusões são diversas:

1) Certas circunstâncias físicas — o meio que se interpõe, o movimento, a distância (uma bengala mergulhada n’água parece quebrada, uma torre vista ao longe parece quadrada, etc.).

2) Certos estados fisiológicos — o daltonismo impede a visão do vermelho, etc.

3) Certos estados psicológicos — a desatenção, a prevenção, o medo, etc.

4) Certos, estados patológicos — a febre torna os alimentos sem sabor.


b) Sonhos — resultam da atividade do espírito durante o sono. Antes, porém, do adormecer, na fase intermediária entre a vigília e o sono, surge, freqüentemente, em nosso espírito, uma floração contínua de imagens simples, rápidas, despidas de intelectualidade e revestidas de um colorido afetivo, às vezes, muito intenso. Essas imagens são chamadas "hipnagógicas". Quando imersos nesse estado, temos o sentimento confuso do caráter alucinatório dessas imagens, sabemos que sonhamos e que bastaria abrir os olhos para interromper essa seqüência de imagens múltiplas e fugazes.Se adormecermos completamente, essas imagens dominam e anulam as percepções e caímos, então, em pleno sonho. As imagens assumem, daí por diante, um aspecto francamente alucinatório e tendem a se dramatizar, isto é, a se ordenar sob a forma de um "assunto", muitas vezes, absurdo, estranho, bizarro. Essa dramatização das imagens é o resultado dessa tendência espontânea que possui o espírito para as construções lógicas.

As representações do sonho têm sempre uma relação, direta ou indireta, consciente ou inconsciente, com as experiências passada e, sobretudo, com os fatos ou pensamentos do dia imediatamente anterior. A memória e a imaginação são os fatores dominantes na gênese das representações do sonho, às quais se associam as imagens suscitadas pelas impressões sensoriais que ocorrem durante o sono. As sensações internas ou viscerais têm uma influência manifesta sobre a gênese das emoções oníricas. Daí os pesadelos, sempre de origem sinestésica. A consciência no sonho é a vida psíquica espontânea, elementar. A consciência na vigília é a vida psíquica organizada. Donde a semelhança da consciência onírica com a consciência Infantil.Se o sonho influi sobre os centros motores do indivíduo, irmos o sonambulismo, em que o sonho se transforma em ação. O caráter alucinatório das imagens é de tal modo imperioso que domina a motricidade, enquanto que as sensações normais se tornam subconscientes. Estas não ficam, entretanto, abolidas: o sonâmbulo é capaz de uma certa adaptação ao meio exterior e pode obedecer a certas sugestões orais. (Piffault)


10. Patologia da percepção. — As alterações patológicas da percepção podem ser de caráter qualitativo ou quantitativo. Vejamos as principais:

a) Hiperpercepção — Aumento de intensidade das percepções, acompanhado, geralmente, de exaltação da atividade psíquica. Em certas neuroses, caracteriza-se por uma capacidade exagerada de ver, ouvir e sentir, provocando, por isso, um estado angustioso no doente.

b) Hipopercepção — Diminuição de intensidade das percepções, acompanhada de enfraquecimento da atividade psíquica. Observa-se nos estados psicastênicos, nas síndromes depressivas, nas esquizofrenias, etc.

c) Micropsia — Os objetos são percebidos com dimensões reduzidas. d)Macropsia — Os objetos são percebidos com dimensões aumentadas.

d) Multipsia — Os objetos são percebidos multiplicados várias vezes.

e) Discromopsia — os objetos são percebidos com cores diferentes das que possuem normalmente.

f) Alucinação — É a percepção sem objeto. O alucinado acredita perceber o que realmente não existe. As alucinações podem se originar de alterações dos órgãos dos sentidos e do sistema nervoso ou de perturbações mentais.


11. Funções da percepção. — A percepção constitui o principal instrumento de aquisição da experiência humana. Por meio das sensações, recolhe do mundo exterior os elementos, que, trabalhados pela inteligência, vão constituir o vasto cabedal dos nossos conhecimentos, a nossa "fortuna psicológica". Daí o velho aforismo: "Nihil est in intellectu quod non antea in sensu fuerit", nada existe na inteligência que antes não haja passado pelos sentidos.Além de fatores da gênese e enriquecimento da nossa experiência, as percepções, por intermédio das sensações, desempenham ainda o papel de instrumentos de adaptação do nosso psiquismo ao universo e à vida.

É assim que as sensações orgânicas mantêm o equilíbrio vital necessário ao funcionamento normal dos nossos órgãos. Do mesmo modo, as sensações visuais, auditivas, tácteis, olfativas, térmicas etc. realizam o ajustamento harmonioso do ser humano ao meio ambiente. Enfim, é através da percepção que se processa a "função do real", considerada por Pierre Janet como o fenômeno psíquico mais alto, mais delicado e mais complexo, graças ao qual o espírito do homem consegue ajustar-se, com precisão, às situações e aspectos cambiantes da realidade.


Fonte: Prof. Cláudio Antônio Arantes Pompeu

Bacharel em Filosofia pela Universidade de São Paulo. Licenciado em Filosofia pela Universidade de São Paulo.

sexta-feira, 20 de março de 2009

A Teoria da Gestalt

A Psicologia da Forma - A Psicologia da Gestalt é uma das tendências teóricas mais coerentes e coesas da história da Psicologia. Seus articuladores se preocuparam em construir não só uma teoria consistente, mas também uma base metodológica forte, que garantisse a consistência teórica.
Gestalt é um termo alemão de difícil tradução. O termo mais próximo em português seria forma ou configuração, que não é muito utilizado por não corresponder exatamente ao seu real significado em Psicologia.
No final do século passado muitos estudiosos procuravam compreender o fenômeno psicológico em seus aspectos naturais (principalmente no sentido da mensurabilidade). A Psicofísica estava em voga.
Ernst Mach (1838-1916), físico, e Chrinstiam von Ehrenfels (1859-1932), filósofo e psicólogo, desenvolviam uma psicofísica com estudos sobre as sensações (o dado psicológico) de espaço-forma e tempo-forma (o dado físico) e podem ser considerados como os mais diretos antecessores da Psicologia da Gestalt.
Max Wertheimer, Wolfgang Köhler e Kurt Koffka, baseados nos estudos psicofísicos que relacionaram a forma e sua percepção, construíram as bases de uma teoria eminentemente psicológica.
Eles iniciaram seus estudos pela percepção e sensação do movimento. Os Gestaltistas estavam preocupados em compreender quais os processos psicológicos envolvidos na ilusão de ótica, quando o estímulo físico é percebido pelo sujeito com uma forma diferente do que ele é na realidade.
É o caso do cinema. Uma fita cinematográfica é composta de fotogramas com imagens estáticas. O movimento que vemos na tela é uma ilusão de ótica causada pelo fenômeno da pós-imagem retiniana (qualquer imagem que vemos demora um pouco para se ‘apagar’ em nossa retina). As imagens vão se sobrepondo em nossa retina e o que percebemos é um movimento. Mas o que de fato é projetado na tela é uma fotografia estática, tal como uma seqüência de slides.


Texto adaptado de: BOCK, Ana Maria. Psicologias. Uma introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva, 1989. pág. 50-57.

“A inteligência dos Antropóides” de Wofgang Köhler














Trabalhando com chimpanzés, usei método um pouco diferente. O antropóide estava preso em uma jaula gradeada, observando-me. Fora do alcance dos seus braços, cavei um buraco, coloquei algumas frutas e cobri tudo — buraco e arredores — com areia. O chimpanzé não conseguia alcançar o alimento desejado, porque o buraco havia sido cavado bem longe de sua jaula. Assim que me aproximei das grades, ele me agarrou o braço e tentou empurrá-lo em direção ao alimento escondido, reação que adotava sempre que não conseguia alcançar, por seus próprios meios, o objetivo desejado.
É claro que esse comportamento já era uma reação retardada. Todavia, como eu desejava um retardamento ainda maior, não lhe fiz o favor pedido. Vendo que suas súplicas não eram atendidas, o chimpanzé largou o meu braço e começou a brincar em sua jaula, aparentemente desatento com o lugar onde a comida fora enterrada. Quarenta e cinco minutos depois, joguei uma vara dentro da jaula, no lado oposto ao do buraco que continha as desejadas frutas. Acostumado que estava a usar varas como instrumentos, o antropóide imediatamente se apossou dela, dirigiu-se para as barras próximas do buraco, e começou a escavar a areia no ponto exato onde estavam enterradas as frutas. Conseguiu desenterrá-la e puxá-las para si. Esse experimento foi repetido muitas vezes — com as frutas enterradas em diferentes lugares — sempre com os mesmo resultados positivos.
Como os comportamentos obtidos eram sempre admiravelmente corretos, resolvi aumentar o tempo entre a percepção do alimento e a oportunidade de obtê-lo. Assim, um dia, enterrei alimento num lugar qualquer do grande terreno que os antropóides usavam para recreação. Os animais assistiram a operação, mas não tiveram oportunidade de obter a comida desejada, porque eu os levei imediatamente para o dormitório. Só os trouxe de volta no dia seguinte, cerca de dezessete horas depois, mais de metade das quais eles passaram dormindo. Pois bem. Assim mesmo, um dos chimpanzés não hesitou um momento: assim que voltou ao pátio de recreio, encaminhou-se diretamente para o local em que as frutas foram enterradas, e descobriu-as após algumas tentativas.
Poder-se-ia dizer que o local onde estava enterrado o alimento não atraiu o antropóide pelo fato de este saber que havia comida ali, mas por causa do aspecto incomum que o terreno apresentava, dada as escavações feitas por mim. Aos meus olhos nada havia de incomum ali, porque tomei a precaução de cobrir toda a área com areia seca. Todavia, para rebater melhor essa crítica, devo acrescentar que, depois de os animais terem sido recolhidos, cavei vários buracos e enchi todos da mesma forma. No entanto, como disse, o animal dirigiu-se ao local certo.
Em outro experimento escondemos uma vara no madeirame do teto, de tal forma que os animais não a podiam ver do chão. Mais uma vez eles observaram com grande interesse o nosso incomum procedimento. Logo a seguir foram levados para o dormitório. Na manhã seguinte, quando um deles foi trazido para a sala em questão, viu algumas bananas do outro lado das grades, fora do alcance dos eus braços. Como fazem os antropóides acostumados a usar bastões, ele olhou em volta — da mesma forma que o faria alguém que estivesse procurando algo –, mas não encontrou nenhum instrumento capaz de o auxiliar. Depois de alguns segundos, olhou para o lugar onde a vara tinha sido escondida na noite anterior. Ele não podia ver a vara, mas, mesmo assim, subiu naquela parte do teto onde ela tinha sido posta. Logo desceu com ela nas mãos, dirigiu-se às bananas e puxou-as para si. Repeti esse experimento com todos os chimpanzés que haviam visto o bastão ser escondido no teto e, todos eles, independentemente uns dos outros, resolveram o problema do mesmo modo.
(…)
Se essa observações tiverem algum fundamento, seremos compelidos a rever nossas teorias a respeito da aprendizagem. Mas isso exigirá, fatalmente, novos experimentos, porque, apesar de já conhecermos algumas coisa a respeito da organização e reorganização de campos perceptivos no homem, quase nada sabemos disso quando se trata de animais. Assim sendo, proponho que realizemos experimentos nesse sentido. Temos métodos para isso. Enquanto esses experimentos não são realizados, podemos adiantar como simples hipótese que, tanto nos animais como nos seres humanos, a forma de apresentação dos estímulos num campo tem grande influência na organização resultante. Uma conseqüência prática dessa hipótese é a seguinte: podemos auxiliar melhor os animais a prenderem, se apresentarmos os estímulos de tal modo e em tais condições gerais de ambientação que esses estímulos tendam espontaneamente a se tornar os fatores dominantes da situação. Todavia, este não é o local apropriado para explicar de que modo isso poderá ser feito.
(…)
Um dia um chimpanzé não foi alimentado pela manhã, mas o seu alimento foi pendurado no teto de seu viveiro. Pusemos uma caixa no chão, a alguns metro do local adequado, mas o animal não a utilizou. Na verdade, ele nunca havia utilizado anteriormente uma caixa como instrumento auxiliar. Tentou, em vão, alcançar o alimento dependurado no teto, pulando para alcançá-lo, subindo pelas paredes externas e se deslocando ao longo do telhado. Em dado momento, ficou tão fatigado que foi várias vezes até a caixa para sentar-se e descansar um pouco, enquanto olhava tristemente para a comida dependurada no teto. Passaram-se muitas horas sem que o chimpanzé mostrasse qualquer indício de ter atinado com a solução do problema. Peguei, então, a caixa, coloquei-a debaixo do alimento, subi nela, e toquei o alimento com as mãos. Em seguida desci e novamente empurrei a caixa para longe. Em menos de um minuto, o chimpanzé, que havia observado os meu procedimentos, pegou a caixa, arrastou-a para baixo do alimento, subiu nela, e conseguiu a fruta desejada.
(…)
Observando o comportamento de um companheiro que sabe resolver o problema, um chimpanzé inteligente percebe logo que, por exemplo, mover a caixa significa deslocá-la para debaixo da comida. O movimento é percebido como um deslocamento com essa orientação fundamental. Por outro lado, um animal estúpido vê o movimento da caixa como algo isolado, isto é, não o relaciona com o local do alimento. Ele verá fases isoladas do desempenho todo, não as percebendo como partes relacionadas com a estrutura essencial da situação, como partes da solução. É claro que essa organização correta não é simplesmente simplesmente transmitida na seqüência de imagens retinianas que a ação do animal modelo produz. Com o imitar acontece o mesmo que com o ensinar. Ao ensinarmos crianças, apenas podemos propiciar a elas condições ou “sinais” favoráveis para as novas coisas que a criança tem de “aprender”; é sempre necessário que a criança também contribua com algo, algo esse que poderíamos chamar de “entendimento”, e que, às vezes, surge de repente. Não podemos simplesmente despejá-lo dentro da criança.

Se, em alguns casos, os antropóides são capazes de “ver” a conexão necessária que existe entre as partes do desempenho que observam e os fundamento de uma situação, surge naturalmente a pergunta. Será que, às vezes, esse animais seriam capazes de inventar desempenhos desempenhos semelhantes, como soluções para novas situações? Um antropóide que vê uma caixa colocada sob algumas frutas dependuradas do teto, mas não diretamente, tentará alcançá-las subindo nela. Como a caixa não está corretamente colocada, talvez o antropóide não consiga alcançar imediatamente o alimento desejado. Seria ele capaz de “entender a situação” e mover um pouco a caixa para que ela fique sob o alimento? Já descrevi, em outra ocasião, o modo pelo qual alguns chimpanzés resolvem esse tipo simples de problema, sem a ajuda de treinos ou da imitação do comportamento de companheiros. Essa descrição já foi uma vez traduzida para o inglês; não há necessidade de repeti-la aqui.
Seja-me, porém, permitido mencionar um aspecto do comportamento dos antropóides, que pode ser observado em muito experimentos. Um antropóide vê seu alimento no chão, fora de sua gaiola e longe do alcance de suas mãos. Ele já usara diversas vezes um bastão como instrumento auxiliar nessa situação, mas, agora, não há nenhum em sua gaiola, mas apenas uma pequena árvore, um tronco com dois ou três galhos. Durante muito tempo o animal não encontra solução para o seu problema. Ele conhece bastões e sabe usá-los mas, agora, não os têm a sua disposição e sim uma árvore. Ele não vê as partes da árvore como bastões em potencial. Mas, de repente, ele descobre a solução do problema: quebra um dos galhos da árvore e o utiliza como um bastão.
(…)

Fragmento de: “A inteligência dos Antropóides” de Wofgang Köhler
Fonte: KOHLER, Wolfgang. Wolfgang Köhler: Psicologia. São Paulo: Ática, 1978. p. 39-56.
Publicação original: Köhler, Wofgang. Intelligence in apes. In MURCHINSON, C. (org.). Psychologies of 1925. Worcester: Clark University Press, 1926. pág. 145-161. (Conferência pronunciada na Clark University em 30 de abril de 1925.) A seguir, fragmentos do texto integral.

Kurt Lewin


Kurt Lewin nasceu em 9 de setembro de 1890 em Mogilno, na Prússia. De sua infância e de sua adolescência ,de seus pais e de sua constituição familiar não sabemos quase nada que possa nos ajudar a decifrar ou pelo menos a perceber seu mistério psicológico. A primeira e única informação que possuímos de sua juventude é que fez seus estudos universitários sucessivamente nas Universidades de Friburgo (Alemanha), Munique e Berlim.
Seus interesses pela Psicologia aparecem gradualmente. Ele se consagra inicialmente à Química e à Física, depois à Filosofia para finalmente dedicar-se à preparação de uma tese de psicologia. Doutora-se em Filosofia pela Universidade de Berlim em 1914, apresentando e defendendo com sucesso uma tese sobre`` A psicologia do comportamento e das emoções``. Sua tese será retomada e completado pôr trabalhos posteriores sendo publicada simultaneamente em Londres e Berlim em 1926. O titulo inglês de sua primeira obra é: ``Investigation into the psychology of behavior and emotion.'' Kurt Lewin começaria sua carreira na Universidade de Berlim em 1914. Mas a guerra tem inicio no verão de 1914. E convocado e servira durante toda a guerra, dela saindo ileso. No outono de 1921 torna-se professor assistente do Instituto de Psicologia da Universidade de Berlim. Do outono de 1918 ao de 1921 não sabemos praticamente nada de Lewin salvo que durante esse período de pós-guerra, publica três artigos sobre a medida dos fenômenos psíquicos. Em 1926 torna-se professor titular de psicologia na Universidade de Berlim. Conservará suas funções e este estatuto acadêmico até a tomada do poder pelos nazistas em 1933.
Em 1933, Lewin, por ser judeu, é obrigado pelos nazistas a deixar a Alemanha com sua família em 24 horas, pagando um resgate para não ser encarcerado em um campo de concentração. Passa pela Inglaterra onde permanece alguns meses, emigrando depois para os EUA, onde é convidado a ensinar na Universidade de Stanford ( California ). Ai permanecera um ano, tornando-se depois professor de Psicologia da Universidade de Cornell, Nova York. A seguir é convidado a ocupar a cátedra de psicologia da criança na Universidade de Iowa e assumir a direção de um centro de Pesquisas ligado a um departamento de psicologia da mesma Universidade, permanecendo ai até 1939. Durante este período, Lewin publica dois trabalhos teóricos, que logo o tornarão celebre: `` A dynamic theory of personality``(56) e ``Principles of topological psychology''(59) .Nesta época, seu interesse principal, e formular uma teoria do conjunto do comportamento individual e, paralelamente, elaborar modelos teóricos que lhe permitam renovar a experimentação e a exploração dos fatos psíquicos. Em 1939, ele volta a Universidade de Stanford e em 1940 torna-se professor na Universidade de Harvard. Em 1945 continuando seu magistério funda, a pedido do M.I.T. (Massachussets Institute of Technology), um centro de pesquisas em dinâmica de grupos. Para Lewin é a ocasião de criar e introduzir no vocabulário dos psicólogos o termo `` Dinâmica dos Grupos ``. No inicio tentara defini-lo por referencia ao contexto acadêmico no qual empreende seus novos projetos de pesquisas. No momento em que Lewin funda Dinâmica dos Grupos, o M.I.T. é o centro mais celebre dos EUA que se consagra em pesquisas em ciências nucleares. Kurt Lewin morreu súbita e prematuramente a 12 de fevereiro de 1947, com 56 anos, em sua residência de Newtonville, situada próxima aos dois centros que trabalhava: Harvard e o M.I.T.. Após sua morte, os professores Alport, de Harvard, e Cautwright, da Universidade de Michigan, em colaboração com sua filha, Gertrud, editam e publicam vários artigos de Lewin sobre dois temas complementares tratando de psicologia social e de dinâmicas de grupos. O primeiro destes volumes intitulado "Resolving social conflicts" e o segundo como "Field theory in social science".
Kurt Lewin era, ao primeiro contato, um homem tímido e por isso mesmo sem flexibilidade e mostrava uma certa dificuldade em abordar as pessoas. Mas para aqueles que trabalhavam diretamente nas pesquisas tornava-se extremamente atraente por sua probidade intelectual, sua ausência de pretensões e sobretudo pelas possibilidades inventivas que mostrava sempre no trabalho. Neste sentido tornava-se uma inspiração para seu colaboradores de pesquisa. Outro traço da personalidade de Lewin era o fato de exigir que tudo fosse discutido explorado e decidido em grupo: hipóteses, objetivos, metodologia e etc. Sempre atento às opiniões e sugestões de onde quer que viessem, respeitoso e disponível, sempre pronto a ajudar seus alunos nos primeiros passos da preparação de suas pesquisas. As descobertas de Kurt Lewin sobre a comunicação humana só constituíram para ele uma ciência depois de serem submetidas a experimentações sistemáticas e a verificações múltiplas na vida concreta dos grupos humanos.

Um Detalhe sobre Kurt Lewin


Kurt Lewin trabalhou durante dez anos com Wertheimer, Koffka e Kohler na universidade de Berlim, dessa colaboração com os pioneiros da Gestalt nasceu sua Teoria de campo. Entretanto não podemos considerar Lewin como um gestaltista, já que ele acaba seguindo um outro rumo. Lewin parte da teoria da gestalt para construir um conhecimento novo e genuíno. Ele abandona a preocupação psicofisiológica da gestalt, para buscar na física as bases metodológicas de sua psicologia. O principal conceito de Lewin é o do espaço vital, que ele define como sendo a totalidade dos fatos que determina o comportamento do indivíduo num certo momento. Kurt Lewin modificou profundamente o curso da Psicologia e pode ser apontado como um dos maiores psicologos contemporâneos. Sua importância não é contudo meramente histórica. O estudo de sua obra nos oferece um excelente meio de romper com a resistência oferecida pela psicologia em aceitar uma abordagem estruturalista de seus problemas, abordagem esta que já demonstrou seu valor em outras ciências humanas, particularmente na Antropologia
Sobre Kurt Lewin, por ocasião de sua morte, escreveu Tolman o seguinte:
"Na futura historia da psicologia do nosso tempo dois nomes destacar-se-ão dentre todos os outros os de Freud e de Lewin. Freud será reverenciado como o primeiro a desvendar as complexidade da historia dos indivíduos e Lewin como aquele que apreendeu as leis dinâmicas segundo as quais os individuos se comportam em relação ao meio. Freud, o clinico e Lewin o experimentalista, dois homens dos quais nos lembraremos sempre, por que suas explorações divergentes mas complementares fizeram da Psicologia uma ciência aplicável tanto aos indivíduos como à sociedade real" (The Psychological Review, 55,1-4).

Wolfgang Köhler


Köhler foi o porta-voz do movimento da Gestalt. Seus livros eram escritos com cuidado e precisão que acabaram se tornando os trabalhos-padrão da psicologia da Gestalt.
Nasceu na Estônia em 1887 e com cinco anos se mudou para o norte da Alemanha. Estudou em universidade em Tübinger, Bonn e Berlim, e doutorou-se orientado por Stumpf, na Universidade de Berlin, em 1909.
Köhler passou sete anos estudando o comportamento dos chimpanzés. Registrou o trabalho no clássico volume The mentality of the apes (1917), lançado na segunda edição em 1924. Por mais que achasse interessante trabalhar com os animais no início, em dois anos ele já havia se cansado de trabalhar com eles.
Em 1922 Köhler substitui Stumpf como professor de psicologia da Universidade de Berlim A provável razão para isso seria o livro Static and stacionary physycak gestalts (1920). Nele, Köhler sugere que a teoria da Gestalt consistia em uma lei geral da naturza que pode ser amplamente aplicada em todas as ciências.
Em 1929, publicou Gestalt psychology, uma descrição completa do movimento da Gestalt.
Deixou a Alemanha nazista em 1935 por causa de divergências com o goversno.
Depois de emigrar para os Estados Unidos Köhler lecionou na Swarthmore College, publicou diversos livros e editou a revista gestáltica Psychological Research. Em 1956, recebeu o Prêmio de Destaque pela Contribuição Científica da APA, órgão que, em 1959, elegeu-o seu presidente. Wolfgang Kholer morreu em Enfield a 11 de Junho de 1967.
Obras importantes de Kohler:
1929, The Place of Value in the World of Facts
1929, Psicologia da Forma
1940, Dynamics in Psychology

Kurt Koffka


Kurt Koffka nasceu em Berlim em 1886. Foi um dos mais criativos fundadores da psicologia da Gestalt. Se interessou por ciência em filosofia freqüentando a University Of Berlin. Estudou psicologia do Carl Stumpf, obtendo Ph.D. em 1909. No ano seguinte começa a se unir a Wertheimer e Köhler, na University of Frankfurt.
Em 1911, Koffka aceitou uma posição na University of Giessen, onde permaneceu até 1924.
Após a primeira guerra mundial e percebendo que os psicólogos americanos estavam começando a tomar conhecimento da psicologia da Gestalt, escreveu um artigo para a revista americana Psychological Bulletin intitulado “Perception an introduction to the Gestalt-Theorie”, onde explicava os conceitos básicos e mostrava algumas pesquisas.
Este artigo teve sua importância, pois explicou aos psicólogos americanos seus conceitos básicos, porém os mesmos acreditaram que a psicologia da Gestalt trabalhava apenas com percepção e que não serviria para nenhuma outra área da psicologia. Tudo isso por causa da palavra “Perception” (percepção), que devido a uma interpretação um pouco deturpada, acabou gerando um enorme equivoco.
Em 1921, Koffka publicou The growth of the mind, um livro que falava a respeito do desenvolvimento infantil. Ele lecionou como professor visitante na Cornell University e na University of Wisconsin e, em 1927, foi indicado para lecionar na Smith College onde permaneceu até a morte, em 1941.

quinta-feira, 12 de março de 2009

O Estroboscópio



1828 - 1832, os cientistas Joseph Plateau e Simon von Stampfer criaram respectivamente o Fenaquistoscópio e o Estroboscópio, ambos partiam do mesmo princípio.O Fenaquistoscópio era composto por dois discos que giravam paralelamente, presos no centro pela mesma haste. O disco de trás possuía uma seqüência de desenhos pintados em torno do eixo, o outro, cortes radiais. O disco da frente possibilitava a interrupção necessária à visão para que as imagens fossem corretamente combinadas. Quando observados através das frestas, os desenhos pareciam estar em movimento contínuo.O Estroboscópio consistia em um único disco com os desenhos em seqüência e cortes radiais. O uso era semelhante, porém deveria ser colocado em frente ao espelho e visualizado por trás. O sucesso dos dispositivos se perpetuou durante o século.

Fenaquistoscópio




domingo, 8 de março de 2009

Max Wertheimer


Max Wertheimer (Praga, 15 de abril de 1880New Rochelle, 12 de outubro de 1943) foi um psicólogo checo, um dos fundadores da Teoria da Gestalt juntamente com Kurt Koffka e Wolfgang Köhler.
Nascido numa família
judaica germanófona, durante sua juventude pensava em seguir carreira como músico; estudou violino, composição de música de câmara e sinfônica.
Em
1900, começa estudar na Universidade de Praga. Um ano após muda de curso, passa a estudar psicologia na Universidade de Berlin, sob a tutela de Carl Stumpf. Em 1904, recebe seu doutorado na Universidade de Würzburg. Esta tese trata de um detector de mentiras empregando o método de associação de palavras.
Em
1910 interessa-se pela percepção do movimento. Com a ajuda de um estroboscopio descobre que, iluminando duas linhas por um breve período de tempo, se têm a sensação de se ver só uma. A este fenômeno chamou de fenômeno phi.
Em
1933 imigra para os Estados Unidos para fugir da perseguição Nazista. Trabalha como professor em Nova York, onde passa os últimos anos de vida. Sua obra só é descoberta postumamente em 1945.
Wertheimer foi um
critico do sistema educacional de sua época, baseado na lógica tradicional e na associação de ideias.
Para ele a
verdade consiste em determinar a estrutura total de experiência e não em captá-la por sensações e percepções singulares associadas.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Psicologia Humanista


O enfoque da psicanálise no inconsciente, e seu determinismo, e o enfoque na observação apenas do comportamento, pelo behaviorismo, foram as críticas mais fortes dos novos movimentos de Psicologia surgidos no meio do século XX. Na verdade o humanismo não é uma escola de pensamento, mas sim um aglomerado de diversas correntes teoricas.

Em comum elas têm o enfoque humanizador do aparelho psiquico, em outras palavras elas focalizam no homem como detentor de liberdade, escolha, sempre no presente. Traz da filosofia fenomenológico existencial um extenso gabarito de idéias. Foi fundada por Abraham Maslow, porém a sua história começa muito tempo antes. A Gestalt foi agregada ao humanismo pela sua visão holística do homem, sendo importante campo da Psicologia, na forma de Gestalt-terapia.

Mas foi Carl Rogers, um psicanalista americano, um dos maiores exponenciais da obra humanista. Ele, depois de anos a finco praticando psicanálise, notou que seu estilo de terapia se diferenciara muito da terapia psicanálitica. Ele utilizava outros métodos, como a fala livre, com poucas intervenções, e o aspecto do sentimento, tanto do paciente, como do terapeuta. Deu-se conta de que o paciente era detentor de seu tratamento, portanto não era passivo, como passa a idéia de paciente, denominando então este como cliente.

Era a terapia centrada no cliente ( ou na pessoa) Seus métodos foram usados nos mais vastos campos do conhecimento humano, como nas aulas centradas nos alunos, etc. Apresentou três conceitos, que seriam agregados posteriormente para toda a Psicologia. Estes eram a congruência (ser o que se sente, sem mentir para si e para os outros), a empatia (capacidade de sentir o que o outro quer dizer, e de entender seu sentimento), e a aceitação incondicional (aceitar o outro como este é, em seus defeitos, angústias, etc.).

Erik Erikson, também psicanalista, trouxe seu estudo sobre as oito fases psicossociais, em detrimento às quatro fases psicossexuais de Freud, onde todas as fases eram interdependentes, e não necessariamente determinam as fases posteriores; para ele o homem sempre irá se desenvolver, não parando na primeira infância. Viktor Frankl, com sua logoterapia, veio a acrescentar os aspectos da existência humana, e do sentido da vida, onde um homem, quando sente um este vazio de sentido na vida, busca auxílio pois não se sente confortável em viver sem sentido ou ideais. Diz também que eventos muito fortes podem adiantar a busca pelo sentido da vida. Tais eventos podem criar desconforto, trauma intenso, mas podem criar um aspecto de fortaleza no indivíduo.

Carl Rogers


Carl Ransom Rogers nasceu a 8 de Janeiro de 1902 em Oak Park nos arredores de Chicago. Tinha quatro irmãos e uma irmã, sendo o antepenúltimo. Faleceu em La Jolla, na Califórnia, a 4 de Fevereiro de 1987 na sequência de uma fractura do colo do fémur. De acordo com as instruções que deixara, as máquinas que mantinham "artificialmente" a sua vida foram desligadas após três dias de coma.


Os pais, de educação universitária, faziam parte de uma comunidade protestante de forte pendor fundamentalista. A família valorizava uma educação moral, religiosa, sendo muito conservadora, isto é, muito enraizada nos valores tradicionais e fechada sobre ela mesma; contudo, intelectualmente era muito estimulante. Desde muito novo Carl Rogers mostrou-se interessado pela leitura e pelo "saber". Foi sempre um aluno excepcionalmente brilhante, mantendo, no entanto, uma colaboração constante nos trabalhos do quotidiano familiar, reduzindo ao mínimo a sua rede relacional fora da família. A hipervalorização do trabalho físico ou intelectual, não dava azo a outras actividades de lazer, que não fosse a leitura dos clássicos, de preferência de carácter religioso.


Quando Rogers tem 12 anos o pai compra uma grande quinta nos arredores de Chicago para onde a família vai morar, com a intenção oficial de fazer uma agricultura "científica". Segundo Carl Rogers, o objectivo real era afastar os filhos dos "perigos da vida da cidade".
A vida na quinta e o trabalho na agricultura levam-no naturalmente a matricular-se em 1919 em Agronomia na Universidade de Wisconsin. Envolve-se em várias actividades comunitárias desenvolvendo as suas capacidades de "facilitador" e organizador. Entra em contacto com meios evangélicos militantes e decide mudar para o curso de História com a intenção de se dedicar posteriormente à carreira eclesiástica. No terceiro ano da faculdade faz uma viagem à China integrado numa delegação americana com o objectivo de participar no Congresso da Federação Mundial dos Estudantes Cristãos. A viagem dura seis meses e, no decorrer da mesma, abandona parte das suas convicções religiosas, abrindo-se à diversificação das ideias e opiniões. Ao chegar de novo aos Estados Unidos ganha uma nova independência e autonomia face às opiniões e posições da família, tendo começado a sofrer de uma úlcera gastroduodenal, provavelmente como resultado deste processo de afirmação.


Guarda, contudo, a sua motivação para uma carreira pastoral e empenha-se social e politicamente, tentando demonstrar a incompatibilidade do cristianismo e da guerra através de escritos sobre o pacifismo do reformador Wyclif ou sobre a posição de Lutero face à autoridade.
Em 1924, Carl Rogers termina a sua licenciatura em História e casa-se com Hellen Elliot, sua amiga de infância, de quem virá a ter dois filhos: David e Natalie.
Após ter obtido a sua licenciatura em História, Carl Rogers matricula-se no Seminário da União Teológica em Nova Iorque, seminário conhecido pelas suas posições "liberais" e, ao mesmo tempo, academicamente bem cotado, recusando a ajuda financeira que o pai, Walter Rogers, lhe oferecia se aceitasse matricular-se no Seminário de Princeton conhecido, então, como muito mais conservador. Durante o primeiro ano nesta instituição, Rogers tem a oportunidade de frequentar alguns cursos na faculdade de psicologia, contactando assim com os psicólogos Goodwin Watson e William Kilpatrick que muito o impressionam. Com outros colegas organiza um seminário de reflexão auto-facilitado e acaba por tomar consciência da sua "não vocação" para o ministério pastoral, apesar do estágio realizado nesse mesmo Verão, como pastor substituto na paróquia de Dorset em Vermont. Assim, no segundo ano do curso transfere-se para o Teachers’ College da Universidade de Columbia com o objectivo de frequentar o curso de psicologia clínica e psicopedagogia. Nessa instituição é marcado pela filosofia de John Dewey que terá um grande impacto na evolução das suas ideias. Entretanto, para sustentar economicamente a família continua a colaborar com instituições eclesiásticas no ensino religioso.


Em 1926, Carl Rogers postula e obtém um lugar de interno no Instituto de Aconselhamento ("guidance") Infantil recém criado pelo Fundo Comunitário de Nova Iorque. Após ter recebido um contrato de 2.500 dólares anuais, querem reduzir-lhe o salário para metade, visto não ser psiquiatra mas psicólogo. Começa a sua primeira "guerra" com a psiquiatria, mas consegue ser pago em igualdade com os psiquiatras.


Em 1928, Carl Rogers doutora-se no Teachers’ College. Na sua tese desenvolvia um teste de personalidade para crianças ainda hoje utilizado. Nessa altura trabalhava como psicólogo no Centro de Observação e Orientação Infantil da Sociedade para a Prevenção da Crueldade sobre as Crianças, em Rochester. A partir de 1929, dirige este Centro e, durante 12 anos, interessa-se pelo trabalho com crianças delinquentes e marginais. Na instituição entra em contacto com Otto Rank que o marca mais pela sua prática terapêutica do que pelas suas teorias. Maior impacto terá, sem dúvida, Jessie Taft que publica em 1933 o livro "The Dynamics of Therapy in a Controlled Relationship" que Carl Rogers considerará como uma obra prima, quer ao nível da forma quer do conteúdo literário. Progressivamente, Rogers abandona uma orientação directiva ou interpretativa, optando por uma perspectiva mais pragmática de escuta dos clientes, numa posição precursora do que mais tarde estruturará como Orientação Não Directiva em terapia.
A partir de 1935 começa a leccionar no Teachers’ College, mas não vê nem o seu ensino nem o seu estatuto de psicólogo reconhecido pelo departamento de psicologia da faculdade e só muito mais tarde, após vários anos de ensino nos departamentos de sociologia e psicopedagogia, e quando já está para abandonar Rochester, o departamento de psicologia o reconhecerá como psicólogo e como docente.


Em 1938, Carl Rogers entra de novo em "guerra" com os psiquiatras. O Centro, em que trabalha e que dirige, transforma-se e amplifica-se e o conselho de administração sob a pressão dos médicos psiquiatras, decide, como então era tradição, contratar para director um psiquiatra, apesar de estarem satisfeitos com o trabalho que Rogers até então realizara. Carl Rogers luta vivamente e consegue ser reconhecido como primeiro director do novo Centro de Aconselhamento de Rochester.


Em 1939, publica o seu primeiro livro: "O tratamento clínico da criança-problema (3) no qual expõe o essencial das suas reflexões e pesquisas realizadas até esse momento.
Com a publicação desse livro começa a ser conhecido na qualidade de psicólogo clínico e é convidado para professor catedrático da Universidade de Estado do Ohio, sendo da sua responsabilidade a cadeira de "Técnicas de Psicoterapia". Não deixando de referir os modelos mais importantes em psicoterapia e aconselhamento, tem a possibilidade de explicitar a sua abordagem terapêutica numa perspectiva que ele considera mais genericamente como "as novas" ou "mais recentes terapias" e que define, por oposição às "antigas", como sendo centrada sobre a expressão, a auto-aceitação, a tomada de consciência e a relação terapêutica, e não sobre a análise do passado, a sugestão ou a interpretação.


Assim, durante a sua passagem pela Universidade de Ohio introduz na faculdade o ensino e a prática da psicoterapia assim como a supervisão e, ainda, surge com a inovação de, pela primeira vez, utilizar a gravação integral das entrevistas e de tratamentos completos, como metodologia de investigação sobre os processos terapêuticos.


Desenvolve progressivamente e de uma forma pragmática, uma intervenção cada vez mais "não directiva", utilizando técnicas de reformulação e clarificação dos sentimentos, assentes numa atitude de maior aceitação dos sentimentos do cliente por parte do terapeuta.


Carl Rogers só tem consciência da originalidade do seu pensamento quando é confrontado com as reacções provocadas pela conferência que faz na Universidade de Minnesota a 11 de Dezembro de 1940. Ele intitula-a: "Novos conceitos em psicoterapia" e nela afirma que "o alvo da nova terapia não é resolver um problema particular, mas ajudar o indivíduo a crescer, de maneira que ele possa fazer face ao problema actual e aos problemas que mais tarde apareçam de uma maneira mais bem integrada... ela baseia-se muito mais na tendência individual para o crescimento, saúde e adaptação...", perspectiva bem percursora da corrente actual da Psicologia da Saúde. Em segundo lugar, diz ainda Rogers, "esta nova terapia põe mais ênfase nos elementos emocionais, nos aspectos emocionais da situação, do que nos aspectos intelectuais..." Em terceiro lugar, "esta nova terapia dá maior ênfase à situação imediata do que ao passado do indivíduo..." Finalmente, diz Rogers, "esta abordagem considera a relação terapêutica em si mesmo como uma experiência de crescimento.


Criticado ou apreciado, ele não deixa os auditores indiferentes e toma consciência de que a sua posição relativamente à terapia é singular. Rogers diz: "Pode parecer absurdo alguém poder nomear o dia em que a Terapia Centrada no Cliente nasceu. Contudo, eu sinto que é possível nomeá-lo como sendo o dia 11 de Dezembro de 1940". Essa data passou, assim, a ser considerada no movimento rogeriano como sendo a fundadora do movimento, ou, talvez fosse mais justo dizer, o mito-fundador da comunidade rogeriana.


Carl Rogers prepara então uma exposição mais detalhada e sistemática da sua abordagem da terapia, que publicará em 1942 no livro Aconselhamento e Psicoterapia (5). Os conceitos de "aconselhamento" e "psicoterapia" parecem cada vez mais equivalentes assim como os de "Orientação Não Directiva em Terapia" e "Terapia Centrada no Cliente". O livro aparece como uma inovação, publicando-se pela primeira vez, e na íntegra, um tratamento a partir da transcrição da sua gravação. Esta obra foi um sucesso e best-seller profissional, se bem que tenha passado despercebido aos jornais e revistas da especialidade quer psiquiátricas, quer psicológicas.


Se por um lado o reconhecimento oficial de Carl Rogers se exprime em honras profissionais — é eleito vice presidente da Associação Americana de Ortopsiquiatria e presidente da Associação Americana de Psicologia Aplicada — , por outro existe uma ambivalência das instituições manifestada pela falta de apoio e por uma certa marginalização na sua Universidade.
Assim, quando no Verão de 1944 é convidado por Ralph Tyler para professor de psicologia na Universidade de Chicago e lhe propõe criar um novo Centro de Aconselhamento, Carl Rogers aceita, deixando atrás de si um grupo de discípulos, alguns dos quais se tornaram em figuras de proa da abordagem centrada na pessoa, tais como, Virgínia Axline, Arthur Combs, Nat Raskins e John Shlien, ou mesmo traçando caminhos novos como Thomas Gordon e Eugene Gendlin.
A criação deste Centro de Aconselhamento Psicológico, leva-o mais uma vez a ter que vivenciar situações de tensão com os psiquiatras e neste caso mais especificamente, com o departamento de psiquiatria da mesma Universidade.


O período de 1945 a 1957 é para Carl Rogers muito rico quer do ponto de vista humano quer do ponto de vista científico, publicando extensa bibliografia e, mais particularmente, o livro "Terapia Centrada no Cliente (6) onde, com a colaboração da sua equipa, faz o ponto das suas pesquisas e reflexões.


No entanto, entre 1949 e 1951, Carl Rogers atravessa um período de profundo sofrimento, pois, após ter vivido momentos de extrema dificuldade no processo psicoterapêutico de uma paciente esquizofrénica, passa por um período de depressão afectando a sua capacidade de trabalho e de funcionamento. Finalmente, aceita a ajuda de um dos seus discípulos, Ollie Bown, com quem faz uma psicoterapia pessoal, experimentando nele mesmo a eficácia do seu modelo, o que lhe proporcionou um longo percurso de "crescimento" pessoal que nunca mais o abandonou.


Podemos dizer que o seu reconhecimento profissional, foi, finalmente, expresso pela sua eleição como presidente da Associação Americana de Psicologia (1946), pela sua eleição como presidente da recém criada Academia Americana de Psicoterapêutas (1956) e pela atribuição em 1956 do Prémio pelo Eminente Contributo Científico (Distinguished Scientific Contribution Award), pela Associação Americana de Psicologia, que sublinhava: "por ter desenvolvido um método original para descrever e analisar o processo terapêutico, por ter formulado uma teoria da psicoterapia e dos seus efeitos na personalidade e no comportamento, susceptível de ser testada, pela extensa e sistemática pesquisa para explicitar o valor do método e explorar e testar as implicações da teoria. A sua imaginação, persistência e adaptação flexível do método científico no ataque dos grandes problemas envolvidos na compreensão e modificação da pessoa moveram esta área de interesse psicológico para dentro das fronteiras da psicologia científica".


O fulcro da sua abordagem passa da importância dada às técnicas para, progressivamente, acentuar as atitudes, isto é, da técnica da reformulação para as atitudes de compreensão empática, de aceitação do cliente, de congruência do terapeuta, de confiança nas capacidades do cliente para a auto-actualização das suas potencialidades e para a auto-organização e, finalmente, para uma valorização das potencialidades terapêuticas da relação.


É também um período de intensa actividade de investigação durante o qual mais de duzentas pesquisas são realizadas assim como milhares de sessões de terapia são gravadas e analisadas. Publica em 1957 um dos seus mais importantes artigos, no qual procura de maneira rigorosa definir "as condições necessárias e suficientes para mudança terapêutica da personalidade", condições essas que seriam comuns a todas as relações terapêuticas quaisquer que fossem os modelos teóricos que as inspirassem e susceptíveis de serem testada experimentalmente. Este artigo continua a ser hoje um dos pilares do modelo da Terapia Centrada no Cliente e tem sido objecto de um corpo numeroso de pesquisa.


O seu nome começa a ser bem conhecido e é convidado por várias Universidades para ensinar como professor convidado (UCLA, Harvard, Berkley, Brandeis, etc.) e, mais particularmente, em 1957 pelo Departamento das Ciências da Educação da Universidade de Wisconsin onde, após uma experiência de alguns meses, acaba por se instalar.


Durante os sete anos que vai durar a sua permanência nessa Universidade, Carl Rogers e a sua equipa fazem um esforço colossal de pesquisa na área da psicoterapia dos doentes esquizofrénicos, publicada, no essencial, em 1967, no livro "A relação terapêutica e o seu impacto".


No Verão de 1961, Carl Rogers faz uma longa viagem ao Japão onde é recebido calorosamente e onde estabelece laços de amizade e de partilha profissional que considera como muito enriquecedores. Nesse mesmo ano publica o livro "Tornar-se pessoa (7) que rapidamente se torna um best-seller mundial.


Nesse livro Carl Rogers explora a aplicação dos princípios da terapia centrada no cliente a outros domínios do humano - educação, relações inter-pessoais, relações familiares, comunicação intergrupal, criatividade — e apresenta a sua abordagem como uma filosofia de vida, uma "maneira de ser" ("a way of being"), com profundas implicações e aplicações em todos os domínios do humano. Foram vendidos quase um milhão de exemplares desta obra.
Rogers investe cada vez mais no trabalho com os grupos de encontro. O interesse pelos grupos já tinha começado em 1946-47, sensivelmente ao mesmo tempo que Kurt Lewin o havia feito no National Training Laboratories em Bethel.


Kurt Lewin e a sua equipa pareciam mais interessados na formação de quadros profissionais, considerando como acessório o aspecto de progresso pessoal dos participantes. Rogers, pelo contrário, considerava este último aspecto como prioritário e fundamental e, sobretudo desde 1960, após a criação do Centro para o Estudo da Pessoa, em La Jolla (1968), considera o trabalho dos grupos de encontro como o instrumento privilegiado não só para o desenvolvimento pessoal mas também para a educação, para a gestão e administração e para a resolução de conflitos.


O livro "Grupos de encontro", publicado em 1970, aparece como um instrumento de trabalho apreciado tanto pelos profissionais como pelos leigos e impõe-se rapidamente como um livro de consulta obrigatória na área. Ele segue uma linha de divulgação e análise da sua pesquisa, que vê premiada, em 1966, através da atribuição do Óscar do melhor documentário de longa duração do ano, ao filme produzido por Bill McGaw "Journey into Self". Este filme apresenta na íntegra uma sessão de grupo de encontro facilitada por Carl Rogers.


Em 1971, em colaboração com o filho David e Orienne Strode, Rogers desenvolve o "Human Dimension Project" para utilização dos grupos de encontro na educação médica e na formação à relação médico-doente. A sua atenção dirige-se também de maneira prioritária, nesta época, para o campo da educação, propondo uma pedagogia centrada no aluno, experiencial. Esta pedagogia aparece como tendo muitos pontos comuns com a que Paulo Freire proporá como "educação não bancária", apesar de Carl Rogers ainda não ter, nesse momento, conhecimento do trabalho de Paulo Freire. A Pedagogia Experiencial é objecto de um grande número de trabalhos de pesquisa que se encontram parcialmente descritos nos dois grandes livros: "Liberdade para Aprender", publicado em 1969, e "Liberdade para Aprender nos Anos 80", publicado em 1983. O essencial da sua mensagem consiste no facto de que os alunos aprendem melhor, são mais assíduos, mais criativos e mais capazes de solucionar problemas quando os professores proporcionam o clima humano e de facilitação que Carl Rogers propõe.


Com 70 anos, Carl Rogers é o primeiro psicólogo americano a receber os dois maiores galardões da Associação Americana de Psicologia, tanto pelo seu contributo científico como pelo seu contributo profissional.


A partir de 1972, dedica-se preferencialmente à intervenção e reflexão sobre os aspectos referentes às áreas do social e do político, explorando as possibilidades maturativas e criativas que os grupos de encontro oferecem. Expõe o essencial destas reflexões no livro publicado em 1977 "Poder Pessoal" (8) e em 1967 apresenta o seu modelo de abordagem centrada na pessoa e a sua filosofia de intervenção não só como um modelo de psicoterapia mas também como uma abordagem eficaz em todas as relações humanas, quer elas sejam relações de ajuda, relações pessoais ou políticas. Richard Farson dirá que Carl Rogers é "o homem cujo efeito cumulativo na sociedade o tornou num dos revolucionários sociais mais importantes do nosso tempo".
Carl Rogers faz uma análise do sucesso das negociações de Camp David, em 1978, entre Israelitas e Egípcios em termos de dinâmica de grupo de encontro e propõe essa formula para a resolução dos conflito sociais e políticos.


Recordemos que o "modelo de Campo David" é aplicado de novo em 1995, com relativo sucesso, para pôr fim, esperemos que definitivamente, ao conflito armado da Bósnia e de novo em 1998 para dar um novo impulso aos acordos de paz no médio oriente.


Rogers facilita, em 1985, em Rast, na Áustria, um workshop com 50 líderes internacionais, incluindo o ex-presidente da Costa Rica, embaixadores e pessoas de grande influência política e diplomática, tendo como objectivo trabalhar, segundo o modelo dos grupos de encontro, na problemática das tensões, então muito fortes na América Central.


Carl Rogers investe cada vez mais nos últimos anos da sua vida na investigação, empenhando-se em grandes workshops transculturais, ou de esforço pela paz e, finalmente em 1987, o seu nome faz parte do grupo das personalidades indicadas para a atribuição do prémio Nobel da Paz. Infelizmente a morte colheu-o antes, num momento em que, apesar da sua idade avançada, continuava perfeitamente lúcido, extremamente activo, e gozando plenamente da vida em todos os domínios desta e, como ele dizia aos seus amigos mais próximos, como nunca o fizera antes. Estes últimos anos foram também marcados, sobretudo após a morte de sua esposa Helen, em Março de 1979, por um maior interesse pela dimensão espiritual do homem, pela sua integração numa globalidade que o transcende e que se insere numa harmonia global do universo. Toma consciência da importância da dimensão da "presença" na terapia, que ele associa a uma forma de comunicação transpessoal e na qual a intuição tem um papel importante. Apresenta-a como um novo campo a explorar no âmbito da sua abordagem e no domínio daquilo que se poderia chamar, talvez, os estados alterados de consciência.


Assim, de uma certa maneira, o circulo se fechara. Dos primeiros interesses e empenhos numa teologia e numa carreira pastoral, Carl Rogers chega ao fim da sua vida a um interesse renovado pelo campo do espiritual no homem, mas num espírito de liberdade e de tolerância, muito longe da visão fundamentalista e estreita da sua juventude. Guardara talvez o aspecto proselitista, a confiança indestrutível num futuro melhor, não ignorando, como ele fez questão de sublinhar em numerosas ocasiões, toda a miséria, dor, sofrimento e mal que nos acompanham na nossa peregrinação.

A difusão do pensamento de Carl Rogers nas ciências humanas.

Quando Rogers começa o seu trabalho de terapeuta, a psicoterapia era considerada nos Estados Unidos como uma actividade médica e só reservada aos médicos. Rogers não só se opõe a este monopólio como até pretende, num primeiro tempo, defender que os médicos, cuja formação privilegia o diagnóstico e a propensão para dirigir os outros, não apresentam a formação de base ideal para a prática desta nova profissão, a qual ele considera naturalmente mais indicada para as pessoas com uma formação de base em psicologia.
Grande parte de seus conceitos foram integrados pelas múltiplas correntes terapêuticas, quando não mesmo pela linguagem comum. A noção de empatia foi retomada por todas as escolas e ninguém desconhece a importância deste conceito desde a psicanálise, sobretudo com Kohut, até às teorias cognitivo-comportamentalistas. Do mesmo modo, quer a congruência, quer a aceitação, foram conceitos que se difundiram de forma tal que a abordagem terapêutica de Carl Rogers parecia condenada a desaparecer diluída e integrada pela multiplicidade das escolas. Talvez o conceito que maior dificuldade teve em ser adequadamente compreendido e integrado tenha sido o de não-directividade, apesar de muitas escolas considerarem a sua intervenção terapêutica como não-directiva.

Poder-se-ia pensar que o ciclo estava concluído e que o pensamento de Carl Rogers, por se ter integrado plenamente na cultura, deixara de ter pertinência e singularidade para se esbater naquela herança cultural que todos partilham sem reivindicar especificidades.
Carl Rogers, referindo-se a estes princípios, escreve que eles "se infiltraram na educação, onde as suas implicações revolucionárias provocam controvérsias. Influenciaram casamentos e parcerias. Afectaram as relações com os pais. Alcançaram indústrias e escolas de gestão... A educação e práticas médicas também sentiram a mudança. Nem mesmo a profissão jurídica ficou isenta. O aconselhamento pastoral foi profundamente mudado. Trabalhadores no desenvolvimento de comunidades actuam de modo diferente. Pessoas de várias ocupações e em todos os caminhos de vida se sentiram com mais poder, descobriram uma compreensão mais profunda do self, aprenderam intimidade".

Podemos dizer que as ideias de Carl Rogers tiveram uma imensa difusão quer no campo da psicologia quer no da psicoterapia e a sua influência estendeu-se a todas as ciências humanas.

A posição de Carl Rogers na Psicologia atual

Durante a maior parte da sua vida Carl Rogers opôs-se à institucionalização do seu pensamento ou das suas ideais e a sua saída do meio universitário, ao trocar a Universidade de Wisconsin pelo Western Behavioral Sciences Institut na Califórnia, provocou indubitavelmente um certo declínio da influencia directa das suas ideias no campo da psicologia em geral e da formação em psicoterapia em particular.
De alguns anos a esta parte, o movimento rogeriano tomou consciência contudo da riqueza da herança recebida e do facto de que a Terapia Centrada no Cliente tinha ainda hoje pleno lugar no panorama das psicoterapias como uma das mais firmemente esteadas na pesquisa e com mais sólidas raízes filosóficas.
Apareceu, assim, uma segunda vaga de terapeutas que no "universo" rogeriano são por vezes considerados como puristas ou ortodoxos e que, sem pôr em causa a filosofia da Abordagem Centrada na Pessoa ou a sua aplicação aos múltiplos campos do humano, propõe o retorno, no campo da psicoterapia, ao modelo dito da Terapia Centrada no Cliente, o qual assenta nos três pilares que acima referimos.
Do mesmo modo, na última década, assistiu-se a um retorno da Abordagem Rogeriana aos meios universitários e a um retomar das actividades de pesquisa, que durante alguns anos tinham passado, de certa maneira, a segundo plano, enquanto que as actividades de exploração dos limites de aplicação e aplicabilidade do modelo filosófico, tinham sido mais privilegiadas.
Nestes últimos dois anos (97 para André de Peretti9 e 98 para Jerold Bozarth (10) e Godfrey Barrett-Lennard (11) ) foram publicadas três obras importantes sobre Carl Rogers e o seu modelo. Em cada uma delas, existe uma parte significativa dedicada à revisão crítica da investigação feita ao longo de mais de 50 anos de existência deste modelo, desde o âmbito da Terapia Centrada no Cliente até ao da Abordagem Centrada na Pessoa, desde os tempos remotos dos anos quarenta e da construção do modelo até aos projectos de investigação recentes e contemporâneos, e desde a especificidade da terapia e do counselling até à pedagogia e à mediação da paz. Nomeadamente, Barrett-Lennard faz uma extensa e cuidada crítica a mais de duzentos projectos de investigação.
Um dos aspectos que me parece particularmente interessante é o empenho posto ao longo de mais de 40 anos, na investigação sobre os efeitos específicos dos modelos terapêuticos.
Já em 1957, Ends e Page (12) comparavam os resultados de três modelos terapêuticos, o psicodinâmico, o rogeriano e o comportamentalista no tratamento de grupo de pacientes hospitalizados com o diagnóstico de "alcoólicos", concluindo que "a abordagem rogeriana centrada no grupo tem a mais larga aplicação e a maior eficácia".
John Shlien, Masak e Dreikers (13) comparavam em 1962 os resultados obtidos, no quadro do Centro de Aconselhamento da Universidade de Chicago, em dois grupos de clientes beneficiando de terapias de tempo limitado (20 sessões); um de inspiração adleriana e o outro segundo o modelo de terapia centrada no cliente, com dois outros grupos de clientes beneficiando dos mesmos modelos de terapia, mas em tratamento sem tempo limitado (em média 37 sessões). Concluíram que os resultados entre os dois modelos não eram do ponto de vista estatístico significativamente diferentes, mas que os clientes pareciam ficar mais rapidamente satisfeitos, em contrapartida, com os resultados obtidos nas terapias de tempo limitado.
As terapias de tempo limitado são um excelente campo de investigação, pela possibilidade de enquadramento num projecto mais controlável e também pela sua brevidade. Um outro estudo que ficou célebre foi o Projecto de Hamburgo (14) em 1981 que consistiu em comparar a psicoterapia de tempo limitado de inspiração psicanalítica com a psicoterapia de tempo limitado centrada no cliente e com um grupo de controle sem terapia, utilizando para tal uma impressionante bateria de testes psicológicos.
Os resultados mostraram uma significativa vantagem no grupo sujeito a terapias em comparação com o grupo que não fez terapia, e uma diferença não significativa entre as duas perspectivas terapêuticas. Contudo, poder-se-ia inferir que os clientes que tinham beneficiado de uma psicoterapia de inspiração psicanalítica tinham no fim do tratamento um maior insight em relação aos que tinham beneficiado de uma psicoterapia centrada no cliente, expressando estes últimos, no entanto, um maior sentimento de "bem estar no seu corpo".
Mais perto de nós e ainda no campo da psicoterapia de tempo limitado centrada no cliente, Odete Nunes (15) fez em 1998 um interessante trabalho de análise com o objectivo de verificar a pertinência de algumas hipóteses teóricas ligadas com a limitação do tempo vivenciada pela díade cliente-terapeuta, e ainda da justeza do enquadramento deste contexto terapêutico no âmbito dos pressupostos de base da psicoterapia centrada no cliente.
Em 1990 Eckert e Biermann-Ratjen (16) comparam os resultados de grupos terapêuticos inspirados nos modelos rogeriano e freudiano e concluem que ambos apresentam iguais resultados na diminuição da depressão, da introversão e do desconforto na adaptação à vida. Mostram também que os que beneficiaram duma abordagem psicanalítica apresentam um maior sentimento de autonomia interna e externa e os que beneficiaram do tratamento inspirado no modelo rogeriano, uma maior capacidade em relacionar-se e contactar com os outros.
De maneira geral verifica-se que a escolha do modelo rogeriano relativamente a outros modelos não assenta numa questão de eficácia, pois é comprovadamente semelhante com a dos principais modelos acreditados no mundo científico, não assenta tão pouco numa especificidade diagnóstica, que aliás o modelo rogeriano sempre rejeitou, mas na opção filosófica quer do cliente, quando esclarecido, quer do terapeuta, no seu posicionamento em relação às questões fundamentais do valor e do respeito do humano e do seu posicionamento na abordagem da pessoa relativamente a uma perspectiva essencialista ou existencialista.
A abordagem rogeriana regressou ao mundo universitário, que alias nunca deixara totalmente, mantendo o rigor da investigação, e na continuidade do trilho de Rogers que dizia que os factos são sempre amigos, consciente do importante contributo que deu e tem para dar no campo do humano.
Qual é o impacto de Carl Rogers ainda hoje? Neste momento de crise economica, social e humana em que os valores do individual tendem a desaparecer, não em proveito de uma percepção adequada do social, mas do macroeconómico em que o indivíduo só é valorizado em termos económicos e que a vida deixou de ter um valor único (vejam-se os corte nas despesas sociais e de saúde actualmente em todos os países desenvolvidos), a mensagem de Rogers parece-nos de novo indispensável para o retorno ao individual, ao pessoal, mas não num pessoal ou individual que se opõe e é incompatível com o social, mas num individual que dá sentido ao social, num conceito isomórfico de organismo, a todos os níveis de organização, numa posição profundamente ecológica, holística ... e humanista.
Foi bem Carl Rogers uma das figuras de proa da chamada terceira força da psicologia, a psicologia humanista, alternativa humanista às posições essencialistas e deterministas das psicanálises e dos comportamentalismos.


Abraham Maslow


Maslow foi um pensador supreendentemente original, pois a maioria dos psicólogos antes dele estavam mais preocupados com a doença e com a anormalidade. Maslow queria saber o que constituía a saúde mental positiva. A psicologia humanista, corrente impulsionada por ele, deu origem a diversas diferentes formas de psicoterapia, todas guiadas pela idéia de que as pessoas possuem todos os recursos internos necessários ao crescimento e à cura e o objetivo da terapia é remover os obstáculos para que o indivíduo consiga isso. A mais famosa dessas técnicas foi a terapia centrada na pessoa, desenvolvida por Carl Rogers. Maslow foi também um dos grandes impulsionadores do movimento transpessoal em psicologia.


Abraham Maslow nasceu no dia 1 de abril de 1908, no Brooklyn, NY. Foi o primeiro dos 7 filhos de seus pais, que eram judeus com pouca educação, imigrantes da Rússia. Seus pais, querendo o melhor para seus filhos, foram extremamente exigentes com Maslow em relação ao sucesso acadêmico. Sua infância parece ter sido muito infeliz, de acordo com seus próprios relatos:
Fui um garoto tremendamente infeliz... Minha família era miserável e minha mãe era uma criatura horrível... Cresci dentro de bibliotecas e sem amigos... Com a infância que tive, é de se surpreender que eu não tenha me tornado um psicótico. (Maslow apud Hoffman, 1999, p. 1)
Para satisfazer seus pais, ele primeiro estudou Direito no
City College of New York (CCNY). Após 3 semestres, ele se transferiu para o Cornell, e depois retornou ao CCNY. Casou-se com Bertha Goodman em 1928, sua prima em primeiro grau, contra a vontade de seus pais. Abraham e Bertha tiveram duas filhas.

O casal mudou-se para Wisconsin para que ele pudesse cursar a Universidade de Wisconsin. Lá, ele se interessou pela psicologia, e seu desempenho escolar melhorou dramaticamente. Passava o tempo lá trabalhando com Harry Harlow, famoso por seus experimentos com bebês-macacos e comportamento de apego.


Maslow terminou sua graduação em 1930, seu mestrado em 1931 e seu doutorado em 1934, todos em psicologia, todos na Universidade de Wisconsin. Um ano após a graduação, ele retornou a NY para trabalhar com E. L. Thorndike na Universidade de Columbia, onde Maslow passou a interessar-se pelo estudo da sexualidade humana.


Começou a lecionar em tempo integral no
Brooklyn College. Durante esse período de sua vida, entrou em contato com muitos intelectuais europeus que estavam migrando para os Estados Unidos, e para o Brooklyn em particular – pessoas como Adler, Fromm, Horney, bem como vários psicólogos freudianos e da Gestalt.

Maslow coordenou o curso de psicologia em
Brandeis de 1951 a 1969. Lá conheceu Kurt Goldstein, que concebeu originalmente a idéia de auto-realização em seu famoso livro "O Organismo" (1934). Foi lá também que Maslow iniciou sua cruzada pela psicologia humanista – algo que se tornou muito mais importante para ele do que suas próprias teorias.
Maslow, junto com Anthony Sutich, foram os principais responsáveis pelo lançamento, nos Estados Unidos, da
Revista de Psicologia Humanista em 1961, e pela fundação da Association for Humanistic Psychology, em 1962.

Já no fim de sua vida, Maslow incentiva Anthony Sutich a criar a
Revista de Psicologia Transpessoal, em 1969. Maslow também incentivou, mas não chegou a ver a fundação da Associação de Psicologia Transpessoal (Association for Transpersonal Psychology), que só ocorreria em 1972.

Ele passou os anos finais de sua vida em semi-reclusão na Califórnia até 8 de junho de 1970, quando morreu de ataque cardíaco após anos de problemas de saúde.