quinta-feira, 2 de abril de 2009

Winnicott - Principais Conceitos

Para Winnicott a criança nasce indefesa. É um ser desintegrado, que percebe de maneira desorganizada os diferentes estímulos provenientes do exterior. O bebê nasce também com uma tendência para o desenvolvimento. A tarefa da mãe é oferecer um suporte adequado para que as condições inatas alcancem um desenvolvimento ótimo.

Holding

Para Winnicott a sustentação ou holding protege contra a afronta fisiológica. O holding deve levar em consideração a sensibilidade epidérmica da criança – tato, temperatura, sensibilidade auditiva, sensibilidade visual, sensibilidade às quedas – assim como o fato de que a criança desconhece a existência de tudo o que não seja ela própria. Inclui toda a rotina de cuidados ao longo do dia e da noite. A sustentação compreende, em especial, o fato físico de sustentar a criança nos braços, e que constitui uma forma de amar. A mãe funciona como um ego auxiliar.
Winnicott propõe que, durante os últimos meses de gestação e primeiras semanas posteriores ao parto, produz-se na mãe um estado psicológico especial, ao qual chamou de “preocupação materna primaria”. A mãe adquire graças a esta sensibilização, uma capacidade particular para se identificar com as necessidades do bebê.
O holding feito pela mãe é o fator que decide a passagem do estado de não-integração, que caracteriza o recém-nascido, para a integração posterior. O vínculo entre a mãe e o bebê assentará as bases para o desenvolvimento saudável das capacidades inatas do indivíduo.

Self Verdadeiro e Falso Self

O ser humano, para Winnicott, nasce como um conjunto desorganizado de pulsões, instintos, capacidades perceptivas e motoras que conforme progride o desenvolvimento vão se integrando, até alcançar uma imagem unificada de si e do mundo externo. (Bleicmar e Bleicmar, 1992).
O papel da mãe é prover o bebê de um ego auxiliar que lhe permita integrar suas sensações corporais, os estímulos ambientais e suas capacidades motoras nascentes.
Quando a mãe não fornece a proteção necessária ao frágil ego do recém-nascido; a criança perceberá esta falha ambiental como uma ameaça à sua continuidade existencial, a qual, por sua vez, provocará nela a vivência subjetiva de que todas as suas percepções e atividades motoras são apenas uma resposta diante do perigo a que se vê exposta. Pouco a pouco, procura substituir a proteção que lhe falta por um “fabricada” por ela. O sujeito vai se envolvendo em uma casca, às custas da qual cresce e se desenvolve o self. O individuo vai se desenvolvendo como uma extensão da casca, como uma extensão do meio atacante.
Winnicott diz que a “mãe boa” é a que responde a onipotência do lactante e, de certo modo, dá-lhe sentido. O self verdadeiro começa a adquirir vida, através da força que a mãe, ao cumprir as expressões da onipotência infantil, dá ao ego débil da criança. A mãe que “não é boa” é incapaz de cumprir a onipotência da criança, pelo que repentinamente deixa de responder ao gesto da mesma, em seu lugar coloca o seu próprio gesto, cujo sentido depende da submissão ou acatamento do mesmo por parte da criança. Esta submissão constitui a primeira fase do self falso e é própria da incapacidade materna para interpretar as necessidades da criança.
Nos casos mais próximos da saúde, o self falso age como uma defesa do verdadeiro, a quem protege sem substituir. Nos casos mais graves, o self falso substitui o real e o indivíduo. Winnicott diz que na saúde o self falso se encontra representado por toda a organização da atitude social cortês e bem educada. Produziu-se um aumento da capacidade do individuo para renunciar a onipotência e ao processo primário, em geral, ganhando assim um lugar na sociedade que jamais se pode conseguir manter mediante unicamente o self verdadeiro. O falso self, especialmente quando se encontra no extremo mais patológico da escala, é acompanhado geralmente por uma sensação subjetiva de vazio, futilidade e irrealidade.

Objeto transicional

O objeto transicional representa a primeira posse “não-ego” da criança, têm um caráter de intermediação entre o seu mundo interno e externo.
Em Winnicott o conceito de objeto ou fenômeno transicional recebe três usos diferentes: um processo evolutivo, como etapa do desenvolvimento; vinculada às angústias de separação e às defesas contra elas; representando um espaço dentro da mente do indivíduo. Ele propõe ainda que em determinadas condições, o fenômeno ou objeto transicional pode ter uma evolução patológica, ou mesmo se associar a certas condições anormais.
O objeto transicional é algo que não está definitivamente nem dentro nem fora da criança; servirá para que o sujeito possa experimentar com essas situações, e para ir demarcando seus próprios limites mentais em relação ao externo e ao interno. Bleichmar e Bleichmar (1992) dizem que o objeto transicional está situado em uma zona intermediária, na qual a criança se exercita na experimentação com objetos, mesmo que estejam fora, sente como parte de si mesma.
Para explicar a constituição do objeto transicional, Winnicott remonta ao primeiro vínculo da criança com o mundo externo, a relação com o seio materno. No princípio, a criança tem uma ilusão de onipotência, vivenciando o seio como sendo parte do seu próprio corpo. Mas, uma vez alcançada esta onipotência ilusória, a mãe deve idealmente, ir desiludindo a criança, pouco a pouco, fazendo com que o bebê adquira a noção de que o seio é uma “possessão”, no sentido de um objeto, mas que não é ele (“pertence-me, mas não sou eu”).
O objeto transicional ocupa para um lugar que Winnicott chama de ilusão. Ao contrario do seio, que não está disponível constantemente, o objeto transicional é conservado pela criança. Ela é quem decide a distância entre ela e tal objeto. Como os fenômenos transacionais “representam” a mãe é essencial que ela seja vivenciado como um objeto bom. Bleichmar e Bleichamar (1992) relatam que, quando dentro da criança, o objeto materno está danificado, é pouco provável que ela recorra, de maneira constante, a um fenômeno transicional.
Winnicott aponta algumas características que são comuns aos objetos transicionais: a criança afirma uma série de direitos sobre o objeto; o objeto é afetuosamente ninado e excitadamente amado e mutilado; deve sobreviver ao ódio, ao amor, e à agressão. É muito importante que o objeto sobreviva à agressão, possibilitando a criança neutraliza-la, dando-lhe, posteriormente, um fim construtivo, ao notar que esta não destrói os objetos.
A ligação e o afastamento do objeto transicional deixa em cada sujeito uma marca: fica na mente do indivíduo um espaço que, assim como o objeto transicional, é intermediário entre o interno e o externo. É nesse espaço que se produz muitas das atividades criativas do homem, como as artes, a musica, etc. que “representam” o mundo interno para o exterior e, em certo sentido, “representa” a realidade para si mesmo.

Desenvolvimento psíquico

Winnicott propõe que a maturação emocional se dê em três etapas sucessivas: a da integração e personalização, a da adaptação à realidade e a de pré-inquietude ou crueldade primitiva.

Integração e personalização

Para Winnicott as experiências iniciais ou diádicas são estruturantes do psiquismo, participam da organização da personalidade e dos sintomas. O bebê nasce em um estado de não integração. Onde os núcleos do ego estão dispersos e, para o bebê, estes núcleos estão incluídos em uma unidade que ele forma com o meio ambiente. A meta desta etapa é a integração dos núcleos do ego e a personalização – adquirir a sensação de que o corpo aloja o verdadeiro self. O objeto unificador do ego inicial não integrado da criança é a mãe e sua atenção (holding).
Na etapa inicial de desenvolvimento a questão primordial é a presença de uma mãe-ambiente confiável que se adapte às suas necessidades de maneira virtualmente perfeita. Gurfinkel (1999) lembra que Winnicott inclui entre as “necessidades do ego” tanto os cuidados físicos quanto os psíquicos. Nem a realização mecânica das tarefas físicas ligadas ao lidar com o bebê, e nem a resposta imediata às suas demandas pulsionais implicam a satisfação das necessidades do ego

A integração é obtida a partir de duas séries de experiências: por um lado tem especial importância a sustentação exercida pela mãe, que “recolhe os pedacinhos do ego”, permitindo a criança que se sinta integrada dentro dela; por outro lado há um tipo de experiência que tende a reunir a personalidade em um todo, a partir de dentro (a atividade mental do bebê). Chega um período em que a criança, graças às experiências citadas, consegue reunir os núcleos do seu ego, adquirindo a noção de que ela é diferente do mundo que a rodeia. Esse momento de diferenciação entre “eu” e “não-eu” pode ser perigoso para o bebê, pois o exterior pode ser sentido como perseguidor e ameaçador. Essas ameaças são neutralizadas, dentro do desenvolvimento sadio, pela existência do cuidado amoroso por parte da mãe.

A personalização – definida por Winnicott como “o sentimento de que a de que a pessoa de alguém encontra-se no próprio corpo”. O autor propõe que o desenvolvimento normal levaria a alcançar um esquema corporal, chamando-o de unidade psique-soma. Gurfinkel (1999) diz que a psique e o soma – que formam o esquema corporal de todo indivíduo – interpenetram-se e desenvolvem-se em uma relação dialética, e apresentam o paradoxo da diversidade na unidade.
Para Winnicott mente e psique são conceitos diferentes; trata-se de registros relacionados, mas heterogêneos. A psique é a elaboração imaginativa das partes, sentimentos e funções somáticas e não se separa, nem se divide do soma. A mente, no desenvolvimento saudável, não é nada mais do que um caso particular do funcionamento do psicossoma, surgindo como uma especialidade a partir da parte psíquica do psicossoma.
Adaptação à realidade

A medida que o desenvolvimento progride, a criança tem um ego relativamente integrado, e com a sensação de que o núcleo do si-próprio habita o seu corpo. Ela e o mundo são duas coisas separadas. A etapa seguinte é conseguir alcançar uma adaptação à realidade.
Nessa etapa a mãe tem o papel de prover a criança com os elementos da realidade com que irá construir a imagem psíquica do mundo externo. A adaptação absoluta do meio ao bebê se torna adaptação relativa, através de um delicado processo gradual de falhas em pequenas doses.
Bleichmar e Bleichmar (1992) dizem que para Winnicott a fantasia precede a objetividade, e o seu enriquecimento com aspectos da realidade depende da ilusão criada pela mãe; tudo repousa no vínculo precoce da criança com sua mãe. Mas o acoplamento entre alucinação infantil e os elementos da realidade fornecidos pela mãe nunca poderá ser perfeito. No entanto, o lactante pode vivê-lo como quase ótimo, graças a uma parte de sua personalidade, que procura preencher o vazio entre alucinação e realidade – a mente.
Winnicott considera que a atividade mental da criança faz com que um meio ambiente suficiente se transforme em um perfeito, converte o relativo fracasso da adaptação em um sucesso adaptativo. O autor fala que o que libera a mãe de ser quase perfeita é a compreensão da criança.
A mente se desenvolve através da capacidade de compreender e compensar as falhas; é uma função do ambiente à medida que ele começa a falhar, Gurfinkel (1999) diz que é apenas à medida que o ambiente falha que ele começa a existir para o bebê enquanto realidade. Portanto, se no início, a tarefa da mãe é adaptar-se de maneira absoluta às necessidades do bebê, em seguida, será de fundamental importância que ela possa fornecer um fracasso gradual da adaptação para que a função mental do bebê se desenvolva satisfatoriamente. O resultado disto será a emergência da capacidade do próprio sujeito de cuidar de seu self, atingindo um estágio de dependência madura.
Quando p ambiente não proporciona os cuidados que o psicossoma considera como elementares, a mente se vê obrigada a uma hiperatividade, o pensamento do indivíduo começa a assumir o controle e a organizar o cuidado ao psique-soma, podendo ocasionar uma oposição entre mente e psicossoma, ocasionado um distanciamento do verdadeiro self. Em estado de saúde, a mente não usurpa as funções do meio, mas possibilita uma compreensão e eventual aproveitamento de sua falha relativa.


Crueldade primitiva (fase de pré-inquietude)

Depois de a criança ter alcançado a diferenciação entre ela e o meio circundante e se adaptar em certa medida à realidade, pela absorção de pautas objetivas dela, que modificam suas fantasia, o último passo que deve dar é integrar em um todo as diferentes imagens que tem de sua mãe e do mundo.
Winnicott pensa que a criança pequena tem uma cota inata de agressividade, que se exprime em determinadas condutas auto-destrutivas. O bebê volta seu ódio sobre si mesmo para proteger o objeto externo; mas esta manobra não é suficiente e em sua fantasia a mãe pode ficar intensamente danificada. (Bleichmar e Bleichmar, 1992).
A mãe é, além do objeto que recebe, em certos momentos, a agressão da criança, é também aquela que cuida dela e a protege. Quando a criança exprime raiva e recebe amor, a criança confirma que a mãe sobreviveu e é um ser separado dela. O bebê adquire a noção de que suas próprias pulsões não são tão danosas e pode, pouco a pouco, aceitar a responsabilidade que possui sobre elas.
Bleichmar e Bleichmar (1992) dizem que simultaneamente a mãe que é agredida e a mãe que cuida vão se aproximando na mente do indivíduo, que assim adquire a capacidade de se preocupar com seu bem-estar, como objeto total. Isto constitui o grande sucesso que, que Winnicott identifica como a última das etapas do desenvolvimento emocional primitivo.

Fonte: Psicologado.com

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